segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Quem vai nos salvar?

Campo Mourão, 27 de agosto. Em algum hospital da cidade. Fato real, tão real quanto seus personagens.
Um médico, escroto, deixou de atender sua paciente grávida, que tinha sofrido um sangramento, porque a mesma só poderia pagá-lo ao final do dia ou, o mais tardar, no dia seguinte. A enfermeira dele disse que ela deveria pagar e caso não pudesse que se dirigisse ao hospital público. O médico se recusou a atender a paciente e a enfermeira frisou que a mesma fosse a outro local... E se não houvesse tempo de chegar? E se houvesse mais sangramento? E se o bebê não aguentasse? E se a mãe não aguentasse?

Era emergência!
Mas, quem se importa? Emergências também se pagam quando a pessoa se propõe a fazer um pré-natal particular. O médico, escroto, deve ter pensado assim. E, com total frieza, concluiu que se não há dinheiro para a consulta, uma vida, duas vidas em risco não são vidas. Não faz diferença. E essa indiferença me mata, me consome. A indiferença em relação à vida não deveria fazer parte daqueles que se propuseram a salvar vidas, penso eu.
Aos médicos, o meu desprezo, porque também fui vítima deles. Passei três anos sem plano de saúde, dependi do Sistema Único de Saúde (SUS), que não me atendia, que não me analisava, que não me curava. Quando meus sintomas começavam a ficar sérios ou a incomodar demais, era obrigada a pagar uma consulta particular – eu ainda tinha essa alternativa. No particular eu era atendida sempre na hora certa. Era analisada, era curada. Entretanto, se deixasse, o tratamento durava mais. Mais consultas eram marcadas, mais remédios me eram prescritos. Afinal, quanto mais idas aos consultórios, laboratórios e afins, maior era a remuneração do médico que me atendia.
Na minha última consulta particular eu me senti lesada. Me senti ofendida até. Passei quinze dias fora de casa e começaram a surgir umas pintinhas na minha batata da perna. Primeiro me dirigi ao SUS, o médico que me atendeu não olhou direito e já disse que era melhor que eu procurasse um especialista, porque ele, médico, não tinha condições de fazer uma análise precisa, já que era ortopedista. O dermatologista foi marcado, marcado para depois de quinze dias.
Como as pintas se espalhavam muito rápido, fui à consulta particular. Lá, a médica sabia exatamente o que era, me medicou. E, para completar, marcou uma biopsia, só para se certificar de que realmente era aquilo que ela pensava que fosse e para a qual já havia me dado remédios. Fiz a biópsia. Depois do resultado voltei ao laboratório, ela nem lembrava de mim, dos meus sintomas. Olhou os exames e disse: era aquilo que eu havia lhe falado, continue com os medicamentos.
Ela realmente tinha acertado. Minhas pintas era meu sistema imunológico apontando que, mais uma vez, eu estava fraca, sensível. Baixa imunidade. Se eu não fosse tão paranóica e se aquelas pintas não se espalhassem tão depressa, não teria pago uma fortuna na biopsia que ela pediu. Pode ser que não seja, mas, depois do resultado e do meu retorno, eu acredito que a médica sabia exatamente o que eu tinha o tempo todo e que fez a biopsia devido às cifras a mais que ganharia e ganhou. Eu sei que posso estar errada, mas...é o que eu penso. Médicos são mercenários, mas existem (mesmo que eu não tenha visto ainda) exceções.
Tenho histórias que denunciam essa ganância. Presenciei a dor de quem não tinha dinheiro e morreu por não ser atendido na hora, porque naquele momento o médico não tinha chego ao hospital público e ainda estava em seu consultório. Sei de situações bizarras protagonizadas por médicos que sempre querem um tantinho a mais. E sei também que parte disso é culpa minha e sua também. Porque eu e você não denunciamos, apesar de tudo. A gente se omite.
E eu também me frustro, comigo mesma e com eles. Mais com eles, os médicos. Frustro-me porque sei que esse perfil não mudará tão cedo. Porque médicos são filhos de médicos ou filhos de grandes advogados, empresários, políticos, engenheiros. Quem faz medicina? Quem nunca precisou do SUS ou quem tem dinheiro suficiente para um tratamento particular no exterior.
Para encerrar meu desabafo e o meu desafeto a essa classe, deixo aqui a história de Gisele, ex-menina de rua que hoje estuda medicina. O texto me trouxe esperança, alívio. Mas também escancara as falhas brasileiras. E então, eu pergunto, quem poderá nos salvar?

4 comentários:

  1. É, flor, em terra onde os heróis não existem, nem o atrapalhado do Chapolim Colorado, melhor mesmo a gente rezar. E muito. Fiquei indignada com a história. De verdade. Acredito que a paciente deva buscar ajuda especializada para fazer algo contra esse médico. Afinal, eles fazem um juramento, na faculdade. E com uma vida, não se brinca. Não há dinheiro no mundo que pague. Espero que ela tenha mais sorte da próxima vez.

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  2. Vi uma matéria no Fantástico ontem, exatamente sobre isso.
    É lamentável a situação da saúde pública no país. Não mesmo que o caráter e o profissionalismo de certos profissionais.

    Que ela faça alguma coisa.

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  3. É de chorar. Mesmo!
    Eu confesso já ter visto um honesto e preocupado médico. Mas... particular.
    Às vezes parece que o "fazer a minha parte" nunca será suficiente.
    Só resta continuar lutando e conscientizando...

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